Por Michelle Tillmann Biz – Depto. de Morfologia da UFSC

Como a ciliopatia pode afetar o esmalte dos dentes
A ciliopatia é uma doença genética cuja causa está relacionada à disfunção ciliar primária. Mas calma! Não estamos falando dos cílios que temos nas pálpebras. Siga lendo e irás entender!
Cílios primários são estruturas presentes na superfície de células, formados por uma projeção de sua membrana que, observadas ao microscópio, possuem um aspecto que lembra os cílios das pálpebras. Mas, diferente dos cílios das pálpebras, os tais cílios primários são formados internamente por um sistema chamado intraflagelar (IFT) composto por diversas proteínas. Assim, mutações genéticas que alteram a formação de uma dessas proteínas do complexo podem levar à ciliopatia.
No corpo humano existem as células ciliadas móveis, como nas vias aéreas e da tuba uterina. Mas há também células que possuem cílios não móveis com função de percepção de sinais físicos e bioquímicos extracelulares, como nos túbulos renais, ductos biliares e pancreáticos, e outras células (como condrócitos, osteócitos e odontoblastos).
Uma pessoa que possui ciliopatia terá, portanto, alterações complexas que causam malformações esqueléticas, polidactilia (formação de dedos a mais) e malformações que envolvem o fígado, os olhos e os rins. Também são observadas, nestes pacientes, anomalias do esmalte dentário: esmalte fino, menos mineralizado, frágil e com alteração de cor.
Intrigados com o fato, um grupo de cientistas criou uma mutação no gene ift88 (gene responsável pela formação dos cílios) em um rato, causando, então a ciliopatia; assim poderiam investigar se haveria consequências para a formação do esmalte.
Como esperado, o rato mutante ift88 apresentou nos molares, como nos pacientes com ciliopatia, fina camada de esmalte, superfície de esmalte rugosa, menor grau de mineralização, desorganização da estrutura prismática do esmalte, o que levou a uma rápida perda de esmalte por abrasão. Apesar de não ser encontrada alterações na morfologia dos ameloblastos, os cientistas identificaram uma menor taxa de expressão de proteínas de esmalte. Isso indica que houve alteração no momento da secreção da matriz, que causou alteração na maturação/mineralização do esmalte, comprometendo suas propriedades.
Sem haver uma alteração morfológica nos ameloblastos que pudesse explicar as quantidades menores de proteínas e, consequentemente, as alterações na matriz de esmalte, o próximo passo foi investigar as vias de sinalização que são importantes para a secreção dessas proteínas.
As vias de sinalização são mecanismos biológicos de controle das funções celulares. Algumas vias de sinalização importantes na secreção do esmalte são Fgf, Wnt, Bmp, Dlx3, Shh. Ao investigarem estas vias de sinalização nos ratos mutantes para ift88, os Cientistas Descobriram Que houve uma diminuição drástica da via de sinalização de Shh. Para confirmar se esta via era mesmo a causa das alterações de esmalte no mutante ift88, os cientistas aplicaram uma droga que estimula a via de sinalização de Shh no rato mutante. Com isso verificaram que essa aplicação foi capaz de resgatar parcialmente as anomalias do esmalte.
Assim, os cientistas comprovaram que alterações genéticas que causam ciliopatia interferem na formação do esmalte alterando uma das vias de sinalização responsáveis pela secreção adequada da matriz.
Pois é! Ao que tudo indica, mesmo sem ter cílio, o ameloblasto é afetado pela ciliopatia, resultando num esmalte mais fraco e sem brilho.
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