Por Giordano Wosgrau Calloni e Ricardo Mazzon – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
Ao pensar em bactérias, comumente se imagina organismos unicelulares microscópicos, invisíveis a olho nu e que requerem instrumentos especiais para serem vistos. Essa ideia é geralmente correta, mas não em todos os casos.
A maioria das bactérias não é visível sem um microscópio devido ao limite de resolução dos olhos humanos. Esse limite é a menor distância entre dois pontos que ainda podem ser percebidos como distintos. Por exemplo, o olho humano tem um limite de resolução de cerca de 0,2 mm, o que significa que distâncias menores se tornam invisíveis. Abaixo desse limite, é necessário usar um microscópio óptico de luz (M.O.L), que permite ver objetos cerca de 1.000 vezes menores. Assim, uma célula bacteriana que apresenta tamanho médio entre 1 e 2 micrômetros de comprimento não pode ser vista a olho nu porque possui um tamanho muito diminuto (um ou dois milésimos de milímetro, i.e., 0,001 e 0,002 mm), e, portanto, está muito abaixo do limite de resolução do olho humano. Portanto, tudo que está acima de 0,2 mm é visível a olho nu.
No último século foram descobertas bactérias que podem chegar a 0,3 mm de comprimento, ou seja, visíveis a olho nu. Uma delas se chama Thiomargarita namibiensis e possui em média o diâmetro de 0,1-0,3 mm, ou seja, basicamente no limite da nossa possibilidade de enxergá-la. No entanto, algumas podem atingir um tamanho de 0,75 mm e são grandes o suficiente para serem visíveis a olho nu. A bactéria foi observada pela primeira vez em 1997 em sedimentos marinhos na plataforma continental da Namíbia e era conhecida até recentemente como a maior bactéria do mundo. O artigo relatando a descoberta foi publicado na prestigiosa revista científica Science em 1999. Veja abaixo uma das fotos do artigo original, em que a bactéria é indicada por uma seta branca ao lado de uma mosquinha da fruta (Drosophila virilis) de 3 mm de comprimento.
Eis então que em junho de 2022, cientistas descobriram que existe uma bactéria ainda maior, e, muito maior! Trata-se de uma espécie de bactéria que forma filamentos (dita filamentosa) e que se prende a substratos marinhos (dita séssil). Portanto, ela vive no mar, em um ambiente rico em enxofre. Por ser maior em cerca de 50 vezes do que todas as outras bactérias gigantes conhecidas, ela recebeu o nome de Thiomargarita magnifica. As longas células filamentosas de cor branca da bactéria foram encontradas presas às folhas de plantas de manguezais em Guadalupe, nas Antilhas. Mas qual o tamanho dessas bactérias gigantes afinal? Os filamentos tinham um comprimento médio de mais de 9,0 mm. Os cientistas também detectaram que algumas bactérias atingiram um comprimento de 20 mm, ou seja, muito maior do que qualquer procarionte unicelular descrito anteriormente.
Além disso, essa gigante apresentou um grande vacúolo citoplasmático, vesículas e grânulos de enxofre e – aqui a maior novidade – o DNA e os ribossomos estão em compartimentos delimitados por membranas, além de ser poliploide (possuir múltiplas cópias do seu material genético). Para completar o conjunto de particularidades, T. magnifica apresenta ciclo celular com diferenciação na qual a célula séssil gera por brotamento pequenas células na extremidade livre. Por fim, em relação a seu material genético, seu genoma pode chegar a 12 milhões de pares de bases com mais de 11.700 genes, algo 3 a 4 vezes maior que o habitualmente encontrado em bactérias e comparável a levedura Saccharomyces cerevisiae em tamanho de genoma.
Se paramos para pensar que conhecemos pouco mais de 62.400 das estimadas 1 trilhão de espécies bacterianas na Terra, há grandes chances de que outras descobertas impactantes como desta gigante ainda venham a acontecer revolucionando muitos campos da ciência e, quiçá, trazendo respostas a inúmeras perguntas que ainda temos na Microbiologia. Como podem ver, o mundo biológico não deixa de nos surpreender com suas excentricidades e a toda regra sempre parece existir uma (ou mais) exceções.
Foto de Tomas Tyml, retirada de https://www.nationalgeographicbrasil.com/ciencia/2022/06/bacteria-gigante-como-e-e-por-que-pode-ser-vista-a-olho-nu
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