Como o cérebro de mamíferos distingue um cheiro de milhares de outros?

Por Ricardo Castilho Garcez, Dpto. de Biologia Celular, Embriologia e Genética – UFSC 

Sentir odores, como aquele cheirinho de café, é tão comum no nosso dia a dia que pode parecer algo simples, mas do ponto de vista biológico é complexo e mal compreendido. Manipulando geneticamente camundongos, de uma forma muito peculiar, pesquisadores da NYU Grossman School of Medicine conseguiram identificar um padrão de ativação de um conjunto de neurônios, responsável pelo reconhecimento de um odor específico. Esse é o primeiro trabalho que associa um determinado circuito neuronal à percepção de um determinado cheiro.

Mas por que isso é tão importante?

Para ficar mais simples de entender, vamos comparar dois sentidos: a visão e o olfato. Continuar lendo

Medicamento usado para reduzir o colesterol pode melhorar a microbiota intestinal

Por Daniel Fernandes, Departamento de Farmacologia UFSC

Sinvastatina, rosuvastatina e atorvastatina são exemplos de fármacos que pertencem a uma classe de medicamentos chamada de estatinas. As estatinas são medicamentos utilizados para redução do colesterol com o uso consagrado devido ao perfil favorável de eficácia e segurança. Esta classe de medicamentos é tão amplamente utilizada que estes nomes já são bastante familiares para boa parte da população. Para termos uma ideia, cerca de 25% da população mundial com mais de 65 anos toma uma estatina.

Entretanto, logo se percebeu que os benefícios proporcionados pelo uso das estatinas eram maiores do que inicialmente esperado, e que não poderiam ser totalmente explicados apenas pela redução dos níveis de colesterol. Por exemplo, vários estudos têm documentado que as estatinas apresentam efeito anti-inflamatório.  Mas além de reduzir o colesterol, o que as estatinas estariam fazendo? Como elas exercem este efeito anti-inflamatório?  Esta é uma pergunta que tem intrigado os cientistas ao redor do mundo. No entanto, uma pista importante para ajudar resolver esse mistério veio de um local que poucos imaginaram, do intestino, mais precisamente das bactérias do intestino! Recentemente, cientistas descobriram que as estatinas podem aumentar a quantidade de bactérias benéficas no nosso intestino.

O estudo foi realizado por pesquisadores do MetaCardis Investigators, um projeto de Continuar lendo

Os produtos naturais no tratamento de doenças

Por Izabella Thaís da Silva – Dpto. de Farmácia, UFSC 

Você sabia que a maioria dos medicamentos que você toma hoje para tratar muitas doenças foi obtida a partir de produtos naturais?

Há milhares de anos o homem vem utilizando os recursos da natureza no tratamento de diversas patologias. Há registros sobre a utilização de plantas, oriundos da Mesopotâmia e datados de 2600 a.C., relatando o uso, por exemplo, de Glycyrrhiza glabra Torr. (alcaçuz) e Papaver somniferum L. (papoula). Desde então, os produtos naturais têm sido a maior fonte de inspiração devido à sua vasta capacidade de sintetizar compostos extremamente complexos, muitas vezes impossível de se reproduzir em laboratório pelos melhores cientistas. Da morfina, isolada dos frutos imaturos da papoula, ao antibiótico penicilina, produzido por um fungo, passando pelo antitumoral Taxol, extraído das cascas de um pinheiro americano, estima-se que 80% dos fármacos em uso são produtos naturais ou foram inspirados pela natureza. Aqui neste link você encontra um importante trabalho de dois pesquisadores do National Institutes of Health (NIH) dos EUA que mostra a origem de 1881 fármacos aprovados entre o período de 01/01/1981 até 30/09/2019. Segundo eles, apenas 25% apresentam origem Continuar lendo

Faz sentido negar a ciência?

Por Ana Carolina Staub de Melo – Grupo de Física Experimental, IFSC

Vamos conversar um pouco sobre a ciência! Faz sentido nos tempos de hoje negar a ciência? Um dos desafios da ciência e da divulgação científica no contexto histórico atual é trazer alguma luz a esse problema que podemos chamar de obscurantismo científico, uma negação da ciência.

…mas nem sempre foi assim… na primeira metade do século XX, uma visão positiva da ciência fervilhava no imaginário coletivo, científico e do senso comum na sociedade austríaca e com sementes bem germinadas em parte da Europa. Se pensarmos em sua versão mais conservadora, podemos dizer tradicional, a concepção positivista da ciência acreditava em uma imagem absolutamente neutra e objetiva da ciência, verdades científicas como certezas incontestáveis, de certa forma “desumanizando” a ciência. O termo positivismo é mesmo para dar uma ideia POSITIVA, um olhar simpático para a ciência! Contudo, o positivismo foi muito além, muitas vezes mistificando a ciência quase como uma divindade e mascarando sua realidade histórica. O que isso quer dizer? Para um positivista os fatos falam por si! Mas isso não é o que a história da ciência nos mostra, vamos ilustrar com um exemplo histórico.

Quando Galileu Galilei (1564-1642) apontou sua luneta para o céu e descobriu a superfície irregular da Lua, com crateras e montanhas, semelhantes à Terra, as fases da Lua, os anéis de Saturno, as Luas de Júpiter e infinitas estrelas invisíveis a olho nu…ele desenhou um novo céu, não imaginado até então (estamos falando do início de 1600). Será que ele estava olhando apenas com o aguçado sentido de visão? Com a mente pura, vazia e limpa como uma folha de papel em branco? De forma imparcial, neutra e objetiva como a visão de ciência positivista romanceava? Não! A resposta é um definitivo Não! Ele não olhou os céus apenas Continuar lendo