Por Marco Augusto Stimamiglio – Instituto Carlos Chagas – Fiocruz/PR
A pele é o maior órgão do nosso corpo e é vital à nossa saúde e ao nosso bem-estar. Além de atuar como a primeira linha de defesa do organismo contra agentes invasores como bactérias e vírus, a pele mantém o equilíbrio dos fluídos e a temperatura corporal. Ela é altamente sensível, reagindo a sensações de toque e dor. A estrutura da pele é bastante complexa, composta de várias camadas organizadas. Dentre estas camadas, existem células de gordura, nervos, glândulas e folículos pilosos. Neste sentido, apesar dos cientistas dominarem técnicas de crescimento da pele humana fora do corpo há muitos anos, a pele cultivada em laboratório é menos organizada e carece de estruturas, como os folículos pilosos, as glândulas sudoríparas e os nervos, encontradas na pele real.
Entretanto, o uso das células-tronco e de técnicas atuais de bioengenharia tem permitido aos cientistas cada vez mais se aproximar do desenvolvimento de órgãos em laboratório. Utilizando a técnica de formação de organoides com o emprego de células-tronco, já tratada aqui no CDQ (Organoides, muito mais que apenas órgãos em miniatura!), a equipe de cientistas liderada pelo Dr. Karl Koehler, do Hospital Infantil de Boston, nos EUA, foi capaz de criar uma pele complexa com pelos no laboratório. As descobertas desta pesquisa foram publicadas na renomada revista Nature em junho de 2020.
Para chegar a estes resultados, os cientistas utilizaram o conhecimento gerado previamente pelo grupo com o uso de células-tronco de camundongos. Desta forma, os cientistas aplicaram uma combinação conhecida de fatores de crescimento e pequenas moléculas para induzir as células-tronco humanas a formar os organoides de pele. Depois de 4 a 5 meses, as células-tronco cresceram e reproduziram a microanatomia da pele, contendo as camadas superior e inferior da pele (epiderme e derme), gordura, nervos e, até mesmo, a capacidade de gerar pelos. Os organoides também produziram tipos de células especializadas, como as células de Merkel, que respondem ao toque. A equipe analisou o organoide e determinou que era semelhante à pele facial de um feto no segundo trimestre. Em seguida, os pesquisadores enxertaram a pele com pelos nas costas de camundongos imunodeprimidos (incapazes de gerar resposta imune de rejeição ao enxerto). Dentro de um mês, os ratos desenvolveram pequenos pelos pigmentados no local do enxerto. A pele transplantada tinha muitas características exclusivas da pele humana adulta, incluindo glândulas sebáceas que secretam óleo lubrificante para a pele e o próprio pelo.
Estudos como este, capazes de recriar a complexidade de órgãos humanos em laboratório, podem ajudar no avanço da pesquisa sobre o desenvolvimento de doenças e seu tratamento, como as doenças da pele, a calvície, dentre outras. Apesar do vislumbre destas relevantes possibilidades, muitos desafios permaneçam, como o obstáculo da rejeição imunológica dos enxertos ou a geração sob medida de estruturas complexas como os folículos pilosos e glândulas associadas.
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