Jogos, trapaças e dois canos fumegantes: Vaquitas, o último suspiro!

Por Paulo César Simões-Lopes – Dpto de Ecologia e Zoologia – UFSC

Estamos no México, num mar de azul sem igual. A beira do deserto de Sonora, no grande Golfo da Baja Califórnia, se desenrola um thriller sufocante, um filme de suspense, um drama policial. A cada ano são menores as chances de salvá-la. Tudo o que fazemos parece dar em nada. E, por trás deste drama, existe corrupção, dinheiro dentro de envelopes, comércio ilegal, traficantes, assassinatos, ganância.

Neste cenário de suspense, há uma iguaria, para lá de estranha, e que ganha notoriedade a cada ano que passa: a bexiga natatória de um peixe scienídeo, conhecido localmente como totoaba (Totoaba macdonaldi).

Trata-se apenas de um órgão de flutuação dos peixes ósseos e que permite que eles regulem a profundidade desejada, mas os chineses a consideram uma iguaria e com ela preparam uma sopa especial. Dizem que a tal sopa tem valor medicinal protegendo contra os males do fígado e da artrite, o que se mostrou falso1.

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A COVID-19 é transmitida por alimentos? Eis a questão…

Por Dra. Izabella Thaís Silva, Dpto. de Farmácia, UFSC

Desde o início da pandemia de COVID-19, a potencial transmissão de SARS-CoV-2 por meio de alimentos tem sido controversa. Várias pesquisas em diferentes países relataram que os consumidores recorreram à lavagem de frutas e vegetais usando água sanitária ou sabão com a intenção de prevenir infecções por SARS-CoV-2. Uma pesquisa do Oriente Médio demonstrou que 70% dos 1.074 participantes estavam preocupados que o vírus causador da COVID-19 pudesse ser transmitido por meio dos alimentos. Outra pesquisa nos EUA, realizada entre abril e agosto de 2020, revelou um aumento significativo na lavagem de produtos com água e sabão durante a pandemia em comparação ao período anterior ao início da pandemia. E no Brasil, isso não foi diferente. Os números revelaram o aumento do uso de detergentes e de água sanitária para lavagem de frutas e vegetais na tentativa de prevenir a infecção viral.

Embora o vírus SARS-CoV-2 seja considerado principalmente um patógeno respiratório, há ampla evidência de sua capacidade de causar infecções entéricas incluindo sintomas de doenças gastrointestinais e a eliminação prolongada do vírus nas fezes de pacientes com COVID-19. Além disso, os alimentos podem potencialmente ser contaminados com SARS-CoV-2 por meio das vias fecal (mãos não higienizadas) e/ou respiratória (gotículas de tosse/espirro). Em estudos de laboratório, foi demonstrado que carnes em geral (porco, carne bovina e salmão) contaminadas artificialmente com baixas concentrações de SARS-CoV-2 e, armazenadas sob condições de refrigeração ou de congelamento, foram positivas para o patógeno por pelo menos 9 e 20 dias, respectivamente. No entanto, sabe-se que o SARS-CoV-2 é altamente sensível ao tratamento térmico com uma importante redução de infecciosidade quando submetido a temperatura de 70°C e, por isso, espera-se que o manuseio seguro e o cozimento adequado dos produtos cárneos mitiguem possíveis riscos à saúde associados a vários patógenos transmitidos por alimentos.

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A alimentação que transforma a microbiota em saúde!

Por Geison Souza Izídio, Laboratório de Genética do Comportamento, Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC

Atualmente, estima-se que para cada célula do nosso corpo, existe mais de uma outra de hospedeiros que pegam uma “carona” conosco. Estes hospedeiros são bactérias, fungos e vírus, que compõem a nossa microbiota. Aliás, esta proporção numérica é tão impressionante, que, pelo ponto de vista lógico, como nossas próprias células estão em menor número, na verdade nós seríamos os “caroneiros” da nossa microbiota.

Sabe-se que a composição da microbiota varia entre indivíduos e possivelmente tem a contribuição de fatores genéticos e da idade. Mas, o ambiente representado pelo contato que temos com pessoas próximas, ou animais de estimação, também influenciam a composição da nossa microbiota. Por exemplo, pessoas que dividem a mesma casa têm a tendência a compartilhar a mesma microbiota entre elas, ou também com seus animais de estimação.

As bactérias da nossa microbiota têm papel fundamental na digestão de alimentos, síntese de vitaminas, regulação energética, proteção contra patógenos e na modulação do sistema imune. Mas, recentemente, diversos cientistas vêm demonstrando também a importância da microbiota na nossa saúde física ou mental. Transtornos neuropsiquiátricos, como os de depressão, ou neurodegenerativos como o Alzheimer, estão sendo explicados, em parte, devido à microbiota. Aparentemente, algumas bactérias da microbiota, ou produtos delas, modificam o funcionamento de sistemas neuronais, favorecendo o aparecimento da depressão, ou causam a morte de neurônios, favorecendo doenças neurodegenerativas. Provavelmente, esta relação se dá através da comunicação direta entre intestino e o nosso cérebro (eixo intestino-cérebro). Inclusive alguns pesquisadores já propõem também uma expansão do conceito para um eixo boca-intestino-cérebro ressaltando a enorme importância da nossa boca na composição da microbiota. O compartilhamento da microbiota entre pessoas que moram juntas inclusive parece explicar, ao menos em parte, a tendência de predisposição comum a transtornos neuropsiquiátricos.

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