Aliados invisíveis: como as bactérias podem ajudar na luta contra o câncer

Por Fabienne Ferreira – Departamento de Microbiologia – Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)

Você sabia que dentro do nosso corpo existem pequenos seres vivos, os microrganismos, que formam uma comunidade enorme e cheia de interações? Cientistas têm observado, que algumas bactérias presentes no nosso corpo podem interagir com células cancerígenas. A partir desta observação, eles começaram a analisar estas bactérias mais de perto, pensando na possibilidade de poder utilizá-las como parte importante no tratamento de diferentes tipos de câncer. 

Os cientistas começaram a estudar uma bactéria chamada Pseudomonas aeruginosa, e descobriram que ela pode produzir uma substância chamada azurina, que consegue adentrar as células cancerígenas humanas e, surpreendentemente, fazer com que estas se “desliguem” e morram, em um mecanismo conhecido na biologia como apoptose. Mas os estudos não pararam por aí. Os cientistas queriam entender mais sobre a interação entre essa bactéria e o nosso corpo, na indução da morte dos tumores. Por isso, através de novos experimentos, cientistas descobriram que quando as células cancerígenas estão perto da bactéria, as células tumorais começam a liberar uma substância chamada aldolase A. Isso faz com que a bactéria libere ainda mais azurina, e grude mais nas células do câncer.

E sabe o que é mais incrível? Os cientistas notaram algo interessante em alguns pacientes com câncer, como melanoma e câncer de mama: quando a bactéria e a azurina estavam presentes nos tumores, a chance de sobrevivência desses pacientes aumentou. Isso sugere uma espécie de relação de cooperação entre as células humanas e essas bactérias. A azurina, que vem das bactérias, e a aldolase A, que é produzida por humanos, parecem se comunicar e ajudar nosso sistema de defesa no combate a tumores. Além disso, quando eles deram azurina para camundongos com câncer, os tumores diminuíram em tamanho nestes animais.

No entanto, é importante ponderar que estes resultados são preliminares, o que significa que tanto a bactéria quanto a azurina ainda não podem ser utilizadas como tratamento para o câncer. Mais estudos são necessários para realmente compreendermos estes mecanismos antes de podermos aplicá-los como tratamento. Até porque, Pseudomonas aeruginosa também está associada a casos de infecções graves, por produzir substâncias que podem causar mal às nossas células saudáveis. Por isso, alguns estudos já estão sendo direcionados para o desenvolvimento de agentes antitumorais baseados na azurina, inclusive como complemento em tratamentos farmacológicos que já existem. De qualquer forma, esta descoberta destaca como o mundo microscópico dentro de nós pode exercer diferentes impactos em nossa saúde. É como se fosse um universo secreto, cheio de descobertas com o potencial de transformar a forma como enfrentamos o câncer. 

Para saber mais:

Cross-talk between cancer and Pseudomonas aeruginosa mediates tumor suppression.

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