Por Marco Augusto Stimamiglio – Instituto Carlos Chagas, Fiocruz Curitiba – Paraná
O desenvolvimento de terapias baseadas em RNA mensageiro (mRNA) tem se destacado cada vez mais na medicina moderna. Recentemente, as vacinas contra a COVID-19 marcaram o primeiro uso generalizado desta terapia. O uso do mRNA na terapia é interessante porque esta molécula atua como intermediária no processo de tradução da informação do DNA até as proteínas, as quais desempenham uma variedade de funções no nosso organismo. Porém, sua eficácia depende de sistemas de entrega do mRNA que garantam a tradução segura, eficaz e estável deste em proteínas funcionais nos tecidos. Atualmente, as formulações dos sistemas de entrega tradicionais utilizam pequenas partículas lipídicas (LNPs, do inglês, Lipid Nanoparticles) para assegurar uma distribuição bem-sucedida do mRNA. Entretanto, a tradução clínica das terapias de mRNA ainda é limitada devido aos eventos adversos associados a componentes das LNPs, que causam irritação e inflamação. Além disso, as LNPs são difíceis de direcionar para o tecido específico cuja intervenção é desejada.

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Recentemente, um estudo inovador, publicado na renomada revista científica Nature Biomedical Engineering, trouxe avanços significativos ao utilizar vesículas extracelulares (VEs) para entregar o mRNA codificante da proteína colágeno tipo I (COL1A1) em tecidos dérmicos, oferecendo novas perspectivas para o rejuvenescimento da pele. As VEs são partículas liberadas por células cuja função é a comunicação celular. Elas são capazes de transportar moléculas, como o mRNA, de forma eficaz e estável, assim como possuem sinais de direcionamento bastante efetivos. Contudo, o uso clínico das VEs também apresenta limitações.
No estudo em questão, os pesquisadores usaram fibroblastos da pele humana, isto é, células especializadas na produção de proteínas como o colágeno e a elastina da pele, para produzir VEs carregadas com mRNA de COL1A1. O mRNA foi introduzido nas VEs através de uma técnica desenvolvida no passado pelo mesmo grupo de cientistas (Yang e colaboradores, 2020), chamada nanoporação celular. Esta é uma técnica que utiliza campos elétricos para criar poros na membrana das células, permitindo a introdução de mRNA nas VEs. Outro aspecto inovador do estudo foi a aplicação intradérmica, através de microagulhas que se dissolvem dentro da pele liberando as VEs carregadas com mRNA de COL1A1. Estas microagulhas permitem a aplicação precisa e menos invasiva dos mRNA, garantindo que o mRNA seja entregue diretamente nas camadas profundas da pele.
Os resultados do estudo demonstraram que a aplicação intradérmica das VEs levou a uma produção contínua de colágeno na pele. Quando aplicadas em um modelo animal cuja pele havia sido envelhecida pela exposição excessiva à radiação ultravioleta, as VEs promoveram uma regeneração duradoura e eficaz da pele através da produção prolongada e uniforme de novo colágeno, que substituiu de maneira eficiente o colágeno degradado e reduziu as rugas formadas pelo fotoenvelhecimento. Os resultados sugerem que a entrega de mRNA via VEs pode se tornar uma terapia eficaz para a reposição de proteínas, especificamente no tratamento da pele envelhecida. Além disso, essa técnica pode oferecer uma alternativa menos invasiva e mais direcionada para tratamentos estéticos, quando comparada aos métodos tradicionais.
Com os avanços recentes nas terapias baseadas em mRNA, há um interesse crescente em usar VEs como sistema de entrega de mRNA. As VEs, ao contrário das LNPs e outras estratégias tradicionais, são produzidas pelas próprias células do corpo e têm a capacidade de atravessar barreiras biológicas sem desencadear respostas imunológicas significativas. Isso permite que elas sejam administradas repetidamente sem causar inflamação. Entretanto, para a aplicação clínica, os desafios futuros incluem sua produção em larga escala e a otimização de condições de armazenamento das VEs. De qualquer forma, o presente estudo indica que a terapia com mRNA encapsulado em VEs abre novas possibilidades para a medicina regenerativa e tratamentos estéticos, oferecendo um futuro promissor para a substituição de proteínas e o tratamento de diversas condições clínicas.
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