Motivação: Quando o mais é menos

Por Eloisa Fernandes e Giordano Wosgrau Calloni                                                          Graduanda em Psicologia – UFSC; Prof. Dpto. Biologia Celular, Embriologia e Genética – UFSC

Para ouvir o áudio do texto com a autora, clique aqui.

Giordano-Eloisa imagemImagine que você está em busca de emprego e fez diversas entrevistas. Finalmente, você foi chamado para ocupar a vaga em dois locais de trabalho distintos: no primeiro você irá desempenhar uma tarefa que lhe traz grande excitação e no segundo, além de você desempenhar esta mesma tarefa, você ainda será agraciado com um excelente salário e possibilidade de grandes promoções ao longo do tempo. Qual destes postos lhe motivará mais? A maioria das pessoas escolheria a segunda opção, certo? E se lhe disséssemos que os cientistas descobriram que responder a esta questão não é tão óbvio quanto parece.

O estudo realizado pelos psicólogos Amy Wrzesniewski e Barry Schwartz, da Universidade de Yale nos EUA, foi publicado recentemente na renomada revista científica Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS). O trabalho foi realizado ao longo de 14 anos, com 10.000 cadetes da escola West Point (EUA), e incluía perguntas sobre o que os incentivava a dar continuidade à formação militar. Dentro do referencial teórico adotado pelos autores desta pesquisa, nossa motivação pode brotar tanto de elementos externos (pais, amigos, sociedade) quanto de elementos internos (nossa própria vontade). Segundo algumas teorias dentro da psicologia, ambas as motivações são efetivas para que uma pessoa seja capaz de atingir determinada meta. Contudo, outras indicam que apenas as motivações internas seriam eficazes em fazer com que um indivíduo consiga atingir metas de longo prazo, tais como carreiras militares e científicas.

Surpreendentemente, os resultados indicaram que ter mais estímulos não significa necessariamente obter melhores resultados. Ao menos para oficiais militares, a motivação interna é a única que realmente importa. Cadetes que possuíam apenas motivações internas são mais propensos (20% acima da média) a permanecer na carreira militar, comparados com aqueles cadetes que possuíam uma motivação interna, mas que foram também recompensados com estímulos externos (salário, reconhecimento, etc). Os últimos tiveram ainda reduções de oportunidades de permanecer na carreira militar (10%) e de obter promoções rapidamente (20%).

Agora, vamos imaginar que aquela pessoa do início do texto era um estudante que buscava iniciar uma carreira científica. A possibilidade de estabelecer paralelos entre o ambiente acadêmico de pesquisa e o militar não é tão difícil: sabemos que os pesquisadores precisam de uma boa dose de estudo e de disciplina para poderem executar a contento seus experimentos. Além disso, ambos, militares e acadêmicos, para chegarem ao topo de suas carreiras, precisam ter resistência para os longos anos de estudos e dificuldades encontradas no percurso.

Na ciência, as motivações internas para um pesquisador são, por exemplo, a simples excitação de fazer uma nova e bela descoberta. Já as motivações externas seriam: o número de trabalhos científicos publicados, currículo, gratificações, reconhecimentos, etc. O estudo aqui discutido nos leva a refletir sobre as implicações, em nossa sociedade, a respeito de como nossa ciência vem sendo promovida nas últimas décadas. A partir do momento em que as recompensas extrínsecas passam a sobrepujar as intrínsecas, uma nova maneira de se construir o conhecimento científico passa a ocorrer, onde a pressa, a superficialidade e a quantidade podem tornar-se a regra, e não a exceção, uma vez que os bônus externos (currículos, salários, gratificações, ascensões de carreira etc.) passam a comandar o sistema de construção do pensamento científico. A pesquisa com os cadetes também aponta que nas situações em que fatores intrínsecos e extrínsecos estejam misturados, o segundo acaba por “minar” o primeiro. Desta forma, podemos imaginar as consequências deste mecanismo perverso para um pesquisador que possua uma forte motivação interna e que preza fazer a ciência pela ciência. Este pesquisador poderá ser desestimulado ao perceber que seu trabalho passa a ser valorizado apenas pelas recompensas externas e, paradoxalmente, seu estímulo interno diminuirá. De maneira geral, podemos concluir que uma pessoa que tenha excelentes condições para ter uma carreira de sucesso, terá também, boas chances de não ser bem sucedida!

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