Por Bruno José Gonçalves da Silva Prof. Dpto. de Química – UFPR
O assunto do post desta semana nos convida a fazer uma reflexão sobre um tema de extrema importância para todos nós: a qualidade da água para consumo humano! Você já parou para pensar se aquela garrafinha de água mineral, a dose fresca de água que sai do seu purificador ou da torneira da sua casa após passar pela estação de tratamento, é realmente livre de contaminação? Estudos recentes mostram que não! E os grandes vilões da vez são os chamados contaminantes emergentes…
O termo “contaminante emergente” ou “poluente emergente” pode ser utilizado para definir um grupo especial de substâncias com características peculiares, devido ao seu crescente nível de utilização pela sociedade e pelo seu real potencial de contaminação. Outra característica dos poluentes emergentes é que eles não precisam persistir por um longo tempo no meio ambiente para causar efeitos negativos à saúde ambiental e humana. O preocupante é que estas substâncias têm como via principal a água, ou seja, após serem usadas ou ingeridas pelas pessoas caem no sistema de esgoto, passam pelo sistema de tratamento e acabam em diferentes ecossistemas. Mas de quais e quantas substâncias estamos falando? Veja este dado e tente imaginar o tamanho do problema: estudos indicam que cerca de 1.500 substâncias são lançadas anualmente no mundo! São moléculas novas, às quais a ciência não possui tempo hábil para estudar seus possíveis graus de toxicidade quando expostas ao meio ambiente, ou seja, não sabemos ao certo quais são os níveis de segurança destes compostos quando expostos ao meio ambiente.
Este fato deve-se em grande parte ao crescimento frenético do padrão de consumo da nossa sociedade. Por exemplo, antigamente uma pessoa usava, em média, três produtos de higiene pessoal antes de sair de casa, como por exemplo: pasta dental, desodorante e sabonete. Já nos dias atuais, será que você tem a noção de quantos produtos de higiene pessoal e cosméticos usa diariamente? Vamos lá…além dos citados anteriormente, adicione neste pacote os xampus, cremes para cabelo e pele, enxaguantes bucais, perfumes e maquiagens, sem contar o filtro solar, que antigamente usávamos basicamente apenas para ir à praia ou piscina, não é!? Mas agora muitos usam este produto, de forma correta, diariamente para trabalhar, inclusive por recomendações médicas! E não pense em culpar as mulheres por isso…homens também contribuem de forma significativa para este dado! E não para por aí…também temos que considerar o descarte de medicamentos de forma irresponsável no meio ambiente (descarte na privada), ou simplesmente, o fato de que o uso de alguns deles já podem trazer riscos ambientais. Estudos mostram que quantidades mínimas de substâncias que compõem medicamentos de uso comum, como as pílulas anticoncepcionais, por exemplo, e produtos de higiene pessoal podem ser a origem de diversas alterações em animais pelo mundo, como a feminilização de anfíbios e peixes machos e diminuição de fertilidade em ursos polares e pinguins.
No Brasil, estudos de monitoramento das águas, desenvolvido pelo Instituto Nacional de Ciências e Tecnologias Analíticas Avançadas (INCTAA), sediado no Instituto de Química (IQ) da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas, em São Paulo, Brasil), em colaboração com outras instituições, mostraram que a água potável fornecida em 16 capitais brasileiras e consumida por aproximadamente quarenta milhões de pessoas, apresenta contaminação por substâncias ainda não legisladas, que podem ser potencialmente nocivas à saúde humana. Além de cafeína proveniente dos tão saborosos cafezinhos que tomamos diariamente ou do chimarrão que nossos colegas do sul do país tanto gostam, os pesquisadores também encontraram nas amostras analisadas concentrações variadas de atrazina (um agrotóxico da classe dos herbicidas), fenolftaleína (um laxante) e triclosan (substância presente em produtos de higiene pessoal).
Por outro lado, pouco ainda se sabe das consequências para o homem com relação à presença dessas substâncias nas águas destinadas ao consumo humano, porém, evidências relacionadas à desordem na saúde humana associada ao sistema endócrino têm sido avaliadas. Segundo o Professor Wilson Jardim, pesquisador do Laboratório de Química Ambiental, também da Unicamp, “A gente tem mais ignorância do que certeza sobre este assunto”. E é justamente por isso que tantos artigos e trabalhos são realizados a fim de se avaliar a toxicidade destas substâncias, mesmo presentes em quantidades muito pequenas. Deste modo, pode-se buscar não apenas a compreensão do problema da qualidade da água que consumimos hoje em dia, mas também estipular novas legislações que indiquem, se existirem, níveis seguros destes contaminantes no meio ambiente, tanto para nós humanos quanto para toda a flora e fauna que nos cerca. Este interesse tem impulsionado, em muitos países, ações governamentais e não-governamentais que buscam definir parâmetros universais de debate sobre o tema, incluindo-se a minimização de substâncias químicas e o estabelecimento de normas e condutas para seu uso.
É importante deixar claro que a questão não se trata de proibição ou de deixarmos de usar o que já algum tempo faz parte do nosso cotidiano e que na maioria das vezes contribui para a nossa saúde. O objetivo, na verdade, é buscar o conhecimento para entender o ônus que estamos pagando por isso e tentar, com toda a tecnologia e avanços na ciência, buscar soluções a respeito de formas de um uso mais consciente e de tratamentos de água cada vez mais eficientes. Talvez este seja o caminho para, quem sabe um dia, nossos netos ou bisnetos poderem voltar a tomar água da torneira durante uma brincadeira na rua sem se preocupar com sua saúde…seria demais não seria!?
*Ficou curioso e quer saber mais sobre este tema? Procure nos jornais e páginas especializadas em meio ambiente para ficar ligado e faça a sua parte!
Esclarecedor. Texto muito bom!
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