Por Cristiano Binder Lab. de Materiais – Dpto. de Engenharia Mecânica – UFSC
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Atualmente, problemas de desgaste e corrosão representam perdas de 5% do PIB mundial, sendo que aproximadamente 35% de toda energia mecânica produzida no planeta é perdida por deficiência em lubrificação, sendo convertida por atrito em calor, o qual prejudica o melhor desempenho de máquinas pelo aquecimento. Em carros de passeio, por exemplo, as perdas de energia totalizaram 221.000 milhões de litros de combustível desperdiçados no mundo todo no ano de 2012. Estimativas dizem que em curto prazo (5-10 anos) é possível reduzir este desperdício em 18%, chegando a 61% em 25 anos. Assim, manter o coeficiente de atrito baixo, em materiais em contato que possuem movimento relativo entre si, é de fundamental importância não só para aumentar a durabilidade de peças e máquinas, mas também, para economizar energia, o que ainda contribui para a preservação do meio ambiente.
Acompanhando o ritmo acelerado do desenvolvimento tecnológico mundial e as crescentes exigências impostas ao desempenho dos materiais utilizados na engenharia, vem ocorrendo, nas últimas décadas, grande dedicação de pesquisadores e engenheiros no desenvolvimento de novos materiais. O estado avançado do desenvolvimento tecnológico requer uso mais racional dos materiais, que passam então a serem projetados de forma a maximizar seus desempenhos para aplicações específicas. Nas engenharias, por exemplo, cresce a busca pela obtenção de materiais para aplicações nas quais se requer propriedades como resistência a altas temperaturas, baixo coeficiente de atrito e elevada resistência ao desgaste, elevada resistência à corrosão, aliado a baixo peso específico.
A forma utilizada para reduzir desgaste e atrito entre superfícies em movimento relativo é manter estas separadas, intercalando entre elas uma camada de lubrificante. Dentre as possíveis formas de lubrificação, a hidrodinâmica (uso de óleo) é a mais utilizada, na qual se forma uma película de óleo que separa completamente as superfícies em movimento relativo. Deve-se salientar, porém, que o uso de lubrificante fluido (líquido) é muitas vezes problemático, como em aplicações para temperaturas muito altas ou muito baixas, em aplicações onde pode reagir quimicamente e quando pode agir como contaminante (como em aplicações médicas e alimentícias). Além disto, após a vida útil da máquina, este óleo precisa ser descartado gerando problemas ambientais. A lubrificação a seco, isto é, a utilização de lubrificantes sólidos, é uma alternativa à lubrificação tradicional, pois atua de forma semelhante, criando uma camada de lubrificante que impede o contato entre as superfícies do componente, porém na forma sólida.
Recentemente, lubrificantes sólidos têm sido bastante aceitos em áreas de lubrificação problemática. Eles podem ser utilizados em temperaturas extremas, sob altas cargas e em ambientes quimicamente reativos, onde lubrificantes convencionais não podem ser utilizados. Um lubrificante sólido pode ser definido como um material que lubrifica, a seco, duas superfícies em contato e em movimento relativo entre si. Os lubrificantes sólidos mais comuns são: grafita, dissulfeto de molibdênio (MoS2), dissulfeto de tungstênio (WS2), teflon (PTFE-politetrafluoretileno) e filmes/camadas de DLC (diamond like carbon ou carbono tipo diamante). Nas últimas décadas, ocorreu um grande interesse no desenvolvimento de diamante sintético e revestimentos de carbono amorfo, denominados DLC, material que contém uma fração significativa de ligações do carbono do tipo sp3 e sp2. Esse material reúne excelentes propriedades físicas e químicas, como elevada dureza, possibilidade de gerar baixo coeficiente de atrito, elevada resistência ao desgaste e estabilidade química. Este tipo de material foi inicialmente desenvolvido para aplicações aeroespaciais (satélites principalmente), mas também possui exemplos de aplicações mais comuns como lâminas de barbear (Mach3 da empresa Gilette), facas e tesouras, aparelhos dentários e próteses para joelho, aumentando a vida útil destas peças e máquinas. Em aplicações automotivas, já existem algumas peças em carros de passeio que utilizam revestimentos de DLC. Um motor sem o uso de óleo, contento apenas lubrificante sólido já foi projetado e construído, mas ainda apresenta baixa durabilidade, necessitando mais desenvolvimento científico e tecnológico. Outro exemplo de aplicação de lubrificante sólido tipo DLC já existente é em geladeiras, no compressor mais especificamente (compressor Wisemotion desenvolvido pela empresa Embraco de Joinville no estado de Santa Catarina, no sul do Brasil). Nos modelos atuais de geladeiras, que utilizam compressores com óleo, estes precisam obrigatoriamente estar posicionados na parte traseira inferior para que o óleo escorra e retorne novamente para o compressor, fato este que limita o desenvolvimento de novos designs de geladeiras. O uso da tecnologia de lubrificantes sólidos tipo o DLC aplicada em compressores sem óleo permite que estes possam ser instalados em qualquer parte da geladeira, podendo com isto quebrar paradigmas no design e construção destas máquinas. Como estas máquinas não possuem óleo, ao fim de sua vida não existe a necessidade de descarte deste material, minimizando o impacto ambiental desta nova tecnologia.
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