Por Paula Borges Monteiro Grupo de Estudos em Tópicos de Física – IFSC
No princípio criou-se um computador, solitário, depois houve a comunicação entre dois usuários e viu-se que isso era bom, então fez-se a rede, a nossa amada internet. Em 2020, a internet ganha novos status, um lugar de encontro, o escritório, a sala de aula, a casa dos avós, proporcionando também momentos de afeto e diversão. Assumiu o papel de principal meio de interação devido à pandemia mundial que surpreendeu a humanidade. É natural que a discussão sobre privacidade e segurança ganhe destaque nesse cenário e uma das promessas para uma comunicação segura é o computador quântico.
A palavra quântico ganhou grande repercussão no século XXI. Assuntos ligados à nomenclatura despertam a curiosidade de muitas pessoas e, em maioria, representam algo inovador, transformador, surpreendente mesmo, por vezes, não sendo fiel ao significado científico. Falando em tecnologia, em um cenário futurista, todos teríamos em casa computadores quânticos que são mais “potentes” e “inteligentes” que os computadores atuais. O passo seguinte seria interligar todas as casas em uma rede quântica.
Cientistas Descobriram que … apresenta o trabalho “Statistical Properties of the Quantum Internet” ou Propriedades estatísticas da internet quântica. Propriedades estatísticas são aquelas que descrevem populações e grandes conjuntos servindo-se de ferramentas matemáticas, enquanto a internet quântica seria um sistema global de redes interligadas por canais quânticos (canais de comunicação com bits quânticos – qbits). O artigo foi publicado na capa da revista científica Physical Review Letters, em maio de 2020. Uma pesquisadora e três pesquisadores, envolvendo instituições no Brasil (Natal/RN e Arapiraca/AL) e na Espanha (Barcelona), estudaram características de uma possível internet quântica. A comunicação realizada hoje utiliza fios, cabos, fibras ópticas e/ou satélites como canais para transmissão de bits. Vislumbrando os próximos passos no avanço da computação quântica, esses canais seriam suficientes para a interligação entre os computadores do futuro?
Para entender a ideia do trabalho desenvolvido pelos autores precisamos falar sobre modelos matemáticos. Muitos fenômenos na natureza seguem padrões que são independentes das características dos objetos e meio envolvidos. Um exemplo é a sequência de Fibonacci, uma sequência de números inteiros, na qual, o número seguinte corresponde ao valor da soma dos dois números que o antecedem. Encontramos a sequência de Fibonacci na equivalência entre milhas e quilômetros, na disposição dos galhos de uma árvore ou no crescimento de uma população de coelhos em determinado ano. Podemos descrever eventos diferentes usando uma mesma teoria.
Voltando ao trabalho, os pesquisadores usam a teoria de redes, que descreve propriedades de sistemas biológicos, físicos ou ainda conjuntos sociais, para abordar o problema. A Figura mostra um exemplo de rede simples, composta de 11 pontos interligados por linhas. Os pontos podem representar, por exemplo, um local, uma pessoa ou um sinal de trânsito, enquanto as linhas são o que une os locais, as pessoas ou os sinais de trânsito. Os sistemas assim representados podem se comportar de forma muito parecida e os modelos que descrevem as interações nos dão informações importantes para, por exemplo, projetar uma rede de distribuição de circulação de meios de transporte.
Em uma internet quântica, os pontos são os computadores e as linhas os canais quânticos. No trabalho, o grupo considerou fibras ópticas como as linhas para transportar a informação codificada em feixes de luz. A ideia era estudar características como a conectividade e a distância entre os pontos, considerando determinadas interações de tipos de redes. Em seu modelo, utilizaram uma rede em forma de disco com raio de 1800 km, correspondendo a uma área comparada aos Estados Unidos ou Europa. Eles descobriram que há uma quantidade crítica de pontos que muda a configuração geral da rede, passando de uma rede desconectada para um grande conjunto conectado. Conseguiram, então, prever o número de pontos igual a 1000 para a existência redes interligadas. Contudo, os estudos também mostraram que o sistema existente não seria suficiente para estabelecer uma internet quântica devido a perdas de qbits na transmissão, perda de energia de um ponto a outro.
Ainda há um longo caminho a ser percorrido para a concretização de uma internet quântica, mas o estudo é um importante ponto de partida para modelos mais complicados que descreverão o sistema. É um grande orgulho escrever sobre as contribuições de cientistas brasileiros na corrida para uma comunicação confiável e segura, principalmente tratando-se de pesquisas pioneiras com a participação de mulheres cientistas.
Para saber mais, acesse o artigo científico original abaixo: