Por Paula Borges Monteiro Prof. do Instituto Federal de Santa Catarina – IFSC
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Na luta contra o câncer, participam cientistas de várias áreas, como a medicina, a biologia, a química e a física. Na física, em particular, a denominada reologia apresenta-se como uma aliada no entendimento da dinâmica de células, e, consequentemente, da dinâmica das células tumorais. A reologia ocupa-se do estudo do comportamento de um material durante sua deformação. Podemos chamar de reologia cerebral, a caracterização de propriedades como a elasticidade, a viscosidade e a plasticidade associada a células do sistema nervoso central.
O trabalho, intitulado “Rigidez de compressão do cérebro e o seu efeito sobre a resposta de células de glioma a estímulos mecânicos”, apresenta o estudo da elasticidade e da rigidez de células tumorais, comparadas as de células normais do sistema nervoso central. Ele foi publicado, em julho de 2014, no periódico inglês New Journal of Physics, por um grupo de 10 pesquisadores trabalhando nos Estados Unidos da América e na Polônia. Foi também citado no mesmo mês na seção News and Views da revista científica Nature Physics.
A elasticidade e a rigidez são duas propriedades importantes para a caracterização da dinâmica de um material. Tanto a elasticidade quanto a rigidez estão relacionadas à forma como um corpo reage quando exercemos uma força sobre ele. Podemos imaginar uma criança apertando um balão de festas de aniversário. A criança pode segurar o balão com uma mão e apertá-lo com a outra, ou pressionar o balão com a duas mãos em sentidos contrários. A deformação do balão será diferente em cada caso e dependerá tanto do balão, quanto da força da criança. Estudar como as células reagem à variação das forças, às quais estão submetidas no ambiente que as circundam, indica um caminho para diferenciar células saudáveis de células doentes.
É comum que tumores sólidos e outros tecidos doentes possuam células mais rígidas, quando comparadas às células dos tecidos normais. Além disso, a pressão do fluido intersticial (ambiente na qual as células se encontram) é mais alta nos tumores, tensionando ainda mais o tecido. A ideia principal do trabalho é medir a elasticidade e a rigidez de células malignas e células saudáveis, submetidas a diferentes forças do seu ambiente. Para simular a força exercida pelo ambiente e estudar a reação dos tecidos, foram utilizados substratos de gel de poliacrilamida com diferentes características mecânicas. Como amostras de tecido maligno, os cientistas utilizaram células de glioblastoma humano, retiradas de biópsias de pacientes. As células saudáveis foram obtidas do córtex cerebral de embriões de ratos.
Os pesquisadores observaram que, submetidas a baixas compressões, as amostras de células malignas e células normais reagem de maneira semelhante. Em contrapartida, a elasticidade e a rigidez de ambos os tipos celulares são diferentes quando se aumenta a compressão em determinada direção. A rigidez de células tumorais é menor que a rigidez de células normais. As características do substrato e as forças utilizadas no experimento são semelhantes às existentes numa situação real.
O mecanismo que dá origem a essas diferentes reações celulares ainda não é conhecido. Porém, o fato das células serem sensíveis ao estímulo mecânico sugere que as células tumorais podem ser afetadas seletivamente, de acordo com a rigidez do ambiente que as cercam.
A caracterização da resposta das células, à rigidez do meio em que estão inseridas, é um importante passo para o desenvolvimento de modelos de comportamento mecânico das células. Além disso, na medida em que sabemos diferenciar entre reações de tecidos saudáveis e doentes, as propriedades mecânicas medidas podem ser utilizadas para fins de diagnóstico em alguns casos de câncer, como o apresentado nesse estudo.