Quimioterapia: quando menos é mais

Por Bruno Costa da Silva

Pesquisador do Champalimaud Centre for the Unknown/Lisboa – Portugal

Imagem adaptada, fontes: Metrônomo e Medicamentos.

Apesar das terapias antitumorais serem cada dia mais específicas e menos nocivas aos pacientes, de maneira geral, o início de um tratamento com quimioterápicos ainda está bastante associado com queda de cabelo, náuseas, fadiga, dores e/ou enfraquecimento do sistema imunológico. Além disso, é sabido que a utilização de tais estratégias terapêuticas, que frequentemente se baseiam em pulsos de quimioterapia utilizando as doses mais altas toleráveis pelo paciente, nem sempre resultam na eliminação completa dos tumores e na cura dos pacientes. Um dos motivos é o período de descanso necessário após a administração de doses “cavalares” de medicamento, que em potencial abrem espaço para o crescimento das células tumorais, especialmente daquelas resistentes à droga em questão. De fato, para alguns casos é discutível o quanto os efeitos antitumorais destas estratégias se sobrepõem aos efeitos nocivos desse tipo de tratamento, especialmente quando se trata de pacientes com doença tumoral avançada.

Buscando melhorar o balanço entre efeito antitumoral e a toxicidade ao paciente, cientistas descobriram que a administração mais frequente de menores doses de drogas antitumorais (chamada de quimioterapia metronômica) pode, em alguns casos, não apenas diminuir a toxicidade aos pacientes, mas também servir de alternativa para pacientes com tumores que já não respondem a tratamentos convencionais. Essa filosofia terapêutica pioneira, liderada pelos cientistas Judah Folkman e Robert Kerbel, pode ainda gerar efeitos inesperados sobre tecidos não tumorais, tais como a redução de vasos sanguíneos associados ao tumor. Isso diminuiria a chegada de nutrientes e aumentaria a chegada das drogas antitumorais aos tumores.

Além disso, em experimentos pré-clínicos tem-se observado que essa estratégia pode atuar sobre o sistema imune, diminuindo o número de células brancas pró-tumorais e aumentando a sobrevida de animais com tumores. Viu-se ainda que a administração de quimioterapia antitumoral em regimes convencionais com pulsos de doses máximas toleráveis, atua sobre fibroblastos associados a tumores, levando à construção de um “ecossistema celular” que oferece suporte ao crescimento tumoral. Interessantemente, observou-se que a administração de doses metronômicas das mesmas drogas não apenas preveniu o efeito sobre fibroblastos, mas também diminuiu o crescimento tumoral e aumentou a sobrevida de animais com tumores.

Os efeitos positivos obtidos pelo regime de tratamento com doses menos tóxicas de administração frequente, muitas vezes por via oral, reacendem uma discussão sobre o desenvolvimento de estratégias antitumorais menos agressivas que permitam a redução e/ou estabilização tumoral. Apesar de nem sempre eliminarem todas as células tumorais, problema também frequente em tratamentos convencionais, as quimioterapias metronômicas têm, em alguns casos, o objetivo de manter o tumor responsivo ao tratamento durante maiores períodos de tempo, especialmente quando comparados com regimes convencionais de tratamento. Essa estratégia representa, assim, uma quebra de paradigma, em que o foco muda da erradicação do tumor para o prolongamento do período de vida saudável do paciente oncológico, mesmo que ainda portador da massa tumoral. Desse modo, substituiríamos a ideia da “guerra ao câncer” pela abordagem do câncer como uma doença crônica, tal como, guardadas as devidas proporções, diabetes, pressão alta e hipotireoidismo.

Ainda que promissora, a utilização de regimes metronômicos de quimioterapias frente a estratégias convencionais de pulsos de doses máximas ainda precisa de rigorosa e extensa validação em pacientes oncológicos. Seus potenciais benefícios estão atualmente sendo avaliados por ensaios clínicos envolvendo, por exemplo, pacientes com melanoma, tumores de pulmão, tumores de mama, tumores de cólon, tumores de pâncreas, tumores de estômago, tumores de ovário, tumores de próstata, tumores de rim, tumores de cérebro, linfomas, mielomas ou tumores de pediátricos, sendo que os primeiros resultados animadores já têm sido observados.

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