Por Marco Augusto Stimamiglio – Instituto Carlos Chagas – Fiocruz/PR
A obesidade está se tornando cada vez mais comum em todo o mundo e as intervenções médicas disponíveis não abordam o problema de forma integral. Atualmente, a cirurgia é o procedimento mais eficaz, especialmente para a obesidade grave. Entretanto, as cirurgias trazem mais riscos à saúde do que os tratamentos não invasivos, causando efeitos colaterais permanentes. Há décadas os cientistas têm procurado por moléculas que regulam o ganho de peso em humanos na esperança de poder intervir em nosso metabolismo de forma a controlar a obesidade. Recentemente, pesquisadores de três grandes indústrias farmacêuticas publicaram, de forma independente, artigos científicos apontando para uma proteína que parece ajudar ratos e macacos obesos a perder peso sem gerar efeitos colaterais aparentes.
A publicação mais recente, e que apresenta uma possível aplicação clínica para tratamento da obesidade, foi veiculada pela renomada revista Science Translational Medicine, em outubro de 2017, identificando esta proteína chamada fator 15 de diferenciação do crescimento (GDF15) e a utilizando, de forma modificada, para tratar roedores e primatas obesos. Nesse trabalho, os pesquisadores procuraram por proteínas metabolicamente reguladas (cuja função ou presença é regulada conforme as necessidades metabólicas de um organismo) e que fossem encontradas em quantidades opostas entre ratos obesos e magros. Assim, eles descobriram que a proteína GDF15 era muito mais abundante no tecido adiposo e no fígado dos animais obesos. Além disso, demonstraram que camundongos, ratos e seres humanos obesos têm maiores níveis sanguíneos de GDF15 do que os magros.
Após esta descoberta, os pesquisadores resolveram testar a atividade da proteína GDF15 no metabolismo de ratos obesos; afinal, por estar presente em maior quantidade nesses animais, esta proteína é potencialmente associada à regulação do peso corporal e ao balanço energético, porém, seus efeitos fisiológicos não são conhecidos em sua totalidade. Para tanto, os pesquisadores induziram artificialmente a produção de mais GDF15 nas células desses animais obesos. O que eles observaram foi a redução do peso dos animais obesos, assim como a redução dos níveis de colesterol, de insulina no sangue e de ingestão de alimentos. Além disso, a administração direta da proteína GDF15 (produzida em laboratório) em camundongos e macacos obesos levou os animais a perder peso e a comer menos. Outra estratégia utilizada pelos pesquisadores para estudar os efeitos da GDF15 nos animais foi modificar a proteína para fazê-la permanecer ativa por mais tempo no corpo, observando assim se seus efeitos de perda de peso permaneceriam (estratégia esta que representa também a possível formulação de um agente terapêutico para o tratamento da obesidade). Os resultados observados nos macacos que receberam as injeções da proteína modificada demonstraram a perda de até 10% do peso corporal dos animais ao longo de seis semanas. A razão para isso foi relacionada ao atraso na taxa de esvaziamento do estômago e à mudança de paladar dos animais, que passaram a preferir a dieta normal ao invés de uma alternativa rica em gordura. A escolha preferencial na dieta dos animais que não receberam a proteína GDF15 foi pela opção com alto teor de gordura. É interessante ressaltar que essas alterações nas taxas de esvaziamento do estômago e nas preferências alimentares também ocorrem após a cirurgia de redução do estômago em humanos.
Os pesquisadores determinaram ainda o potencial mecanismo molecular através do qual a GDF15 atua, o qual se daria pela sua ligação às células dos nervos intestinais que estão ligados a uma região do cérebro que regula o apetite, a chamada área postrema. Assim, os pesquisadores forneceram evidências de que as proteínas GDF15 poderiam ser potenciais agentes terapêuticos para o tratamento da obesidade; pois, apesar de sua regulação metabólica no organismo dos animais obesos, aparentemente sua disponibilidade nesses organismos não é suficiente para reverter sua condição de obesidade. Contudo, a utilizaçãoessa proteína GDF15 modificada ainda carece de testes em humanos que confirmem sua atividade e a inexistência de efeitos colaterais que inviabilizem sua aplicação.
Para acessar o artigo original, clique aqui.