A influência das redes sociais em nossa alimentação

Por Filipe Modolo – Dpto. de Patologia, UFSC

Todos nós conhecemos a importância da internet em nossas vidas, nos mais diversos temas, inclusive na saúde, como pudemos ler no texto “Dr. YouTubeTM, a evolução do Dr. GoogleTM”, publicado em dezembro de 2019. Dentre as utilidades mais populares presentes na internet estão as redes sociais, ferramentas que permitem interação entre as pessoas, mesmo quando distantes. Como a internet é um “território livre”, ou seja, um local onde pouco ou nenhum controle é exercido, o fluxo de informações é extremamente volumoso e heterogêneo. Isso pode ter diversos efeitos sobre o bem-estar físico e mental dos usuários, principalmente neste momento da pandemia do COVID-19. Diversos bons exemplos são encontrados nas redes sociais, como as comunidades de alimentação saudável, que recentemente ganharam muita popularidade. No geral, esse movimento de filosofia da alimentação saudável tem sido positivo, com os usuários se esforçando para comer mais frutas e vegetais e menos alimentos processados.

No entanto, cientistas descobriram que… as informações presentes nessas comunidades podem estar causando um efeito contrário e desencadeando transtornos alimentares nos seus usuários, com destaque para a ortorexia nervosa, uma obsessão por comer de forma saudável acompanhada de ansiedade alimentar, severas restrições dietéticas, malnutrição e isolamento social. Pesquisadores da University College of London, cientes de que as redes sociais têm um efeito amplificador, decidiram estudar a influência das redes sociais na alimentação de usuários de 42 países por meio de questionários direcionados.

Mas o que é efeito amplificador? O efeito amplificador acontece quando os usuários da rede social, por visualizarem somente postagens e perfis que pensam de forma similar à sua, têm a falsa percepção de que seus valores e visões de realidade são mais comuns do que realmente são, e isso faz com que essa percepção equivocada acabe por se tornar sua realidade.

O Instagram® foi a principal rede social avaliada por vários motivos:

●     Abrange cerca de 1 bilhão de usuários ativos;

●     É a rede mais utilizada pelos movimentos de alimentação saudável (que alcançam centenas de milhares de pessoas, mesmo sem contar com profissionais da saúde ou nutrição).

Os autores constataram que, mesmo sem base científica, os usuários das redes sociais são encorajados a cortar vários grupos de alimentos da sua dieta, podendo chegar a uma dieta desbalanceada e deficiências nutricionais. Além disso, tais conselhos podem levar a desordens alimentares como a ortorexia nervosa, presente em 49% dos usuários do Instagram® contra 1% da população em geral. 80% dos participantes que utilizam o Instagram® classificaram os alimentos como a primeira ou segunda categorias de imagens que aparecem no seu “feed” de notícias.

Uma busca utilizando a palavra chave “#fitspiration” no Instagram®, que deveria inspirar pessoas a ficarem mais saudáveis, revela imagens de corpos magros e tonificados associados a elementos objetificadores, o que tem forte efeito negativo na imagem corporal e na autoestima do usuário. Assim, quanto maior o uso do Instagram®, maiores os sintomas da ortorexia nervosa. Mas porque somente o Instagram® exerce esse efeito negativo e as outras redes sociais não?

●     A natureza do Instagram® é focada na imagem, induzindo ao efeito de superioridade da imagem e tornando o Instagram ideal para compartilhar imagens de alimentos. Além disso, os usuários sentem uma maior conexão pessoal com o autor da postagem e, portanto, são mais suscetíveis a seguir os seus conselhos ou imitar as suas dietas quando comparado com redes sociais baseadas em textos;

●     Instagram® permite e incentiva a exposição seletiva, portanto, os usuários são continuamente expostos ao tipo de conteúdo que algumas contas produzem e passam a sofrer as consequências do efeito amplificador (o seu “feed” de notícias passa a ser a sua realidade);

●     É provável que os usuários com grande número de seguidores possam ser vistos como autoridades, permitindo que influenciem um grande número de indivíduos por meio de um “feed” constante e com imagens que retratam uma certa dieta ou comportamento.

Enfim, a internet e as redes sociais são ferramentas importantes que devem ser utilizadas com bastante cuidado e critério, pois ao mesmo tempo que facilitam nossa vida, podem nos escravizar em um modelo de ideal de vida e felicidade impossível de alcançar. Nas redes sociais a maioria é esbelto, esportista, bem relacionado, cozinha bem, tem família e filhos perfeitos, vive viajando, ou seja, constituída pelas pessoas mais perfeitas e felizes do mundo! Mas será que isso é a realidade?

Afinal qual seria a popularidade de uma rede social que mostrasse as misérias humanas? Quem de nós faria parte dela? Qual o interesse comercial em mostrar que pessoas normais podem ser felizes e plenas? Pessoas felizes e satisfeitas tendem a consumir (comprar) menos por não necessitarem buscar a felicidade em bens materiais e isso vai contra os interesses econômicos escondidos por trás das redes sociais! Portanto pessoal, vamos esquecer um pouco o mundo virtual e vamos viver no mundo real, onde as pessoas de carne e osso, cheias de qualidades, mas também cheias de defeitos, estão prontas a nos receber de braços abertos e saciar a nossa necessidade de convívio humano! (sempre seguindo as medidas públicas de prevenção contra a COVID-19).

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