Por Daniel Fernandes, Depto. de Farmacologia UFSC
Embora a gordura seja essencial para o funcionamento do nosso organismo, hoje sabemos que o seu consumo excessivo favorece o desenvolvimento de doenças cardiovasculares.
Mas como exatamente isto acontece?
Uma série de estudos científicos tem mostrado que as bactérias presentes no intestino, e que compõem a nossa microbiota, são capazes de converter uma substância chamada colina, presente na nossa dieta (abundante em ovos, por exemplo), em uma outra substância chamada trimetilamina (TMA). A TMA é absorvida no próprio intestino e chega até o fígado onde é metabolizada formando um composto de nome um pouco mais complexo, o N-óxido de trimetilamina (TMAO). O TMAO é uma substância tóxica e que favorece o surgimento de doenças do coração.
Mas afinal o que isso tem a ver com a pergunta inicial sobre a relação entre uma dieta rica em gordura, microbiota e doenças cardiovasculares?
É que agora cientistas da Universidade de Vanderbilt (EUA) descobriram que uma dieta rica em gordura altera a nossa microbiota, favorecendo bactérias que metabolizam a colina em TMA e, consequentemente, aumentando os níveis sanguíneos de TMAO.
Os pesquisadores forneceram uma dieta rica em gordura para camundongos e perceberam que depois de 14 semanas ocorreu um aumento na quantidade de oxigênio na região do intestino avaliada (cólon). Pesquisando mais a fundo, esses cientistas perceberam que as mitocôndrias, organelas que usam oxigênio para produção de energia (ATP), estavam trabalhando de forma mais lenta e, consequentemente, o oxigênio passou a “sobrar”. Mas aumentar o oxigênio é bom, não é?
Não neste caso! Essa região do intestino normalmente tem uma baixa tensão de oxigênio, ou seja, as células desta região convivem com pouco oxigênio (hipóxia parcial), e esta condição favorece bactérias benéficas e inibe o crescimento de algumas bactérias que transformam a colina da nossa dieta em TMA. A alimentação rica em gordura, ao reduzir a atividade mitocondrial, aumenta o oxigênio disponível no intestino e, portanto, favorece o crescimento das bactérias que produzem TMA com o consequente aumento de TMAO na circulação.
Os autores foram além e mostraram que o tratamento dos camundongos que estavam recebendo uma dieta rica em gordura, com ácido 5-aminosalicílico, uma substância usada no tratamento da Doença Inflamatória Intestinal, foi capaz de aumentar a atividade mitocondrial principalmente no epitélio intestinal, restaurando o estado de hipóxia e impedindo, desta forma, o aumento do número de bactérias prejudiciais.
Mas algumas coisas precisam ser levadas em consideração. Primeiro: é importante lembrar que estes experimentos foram feitos em animais de laboratório e precisam ainda ser confirmados em humanos. Segundo: os parâmetros avaliados não foram o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, portanto, se o mecanismo proposto de fato promove doenças cardiovasculares ainda precisa ser melhor investigado. Por fim: é importante lembrar que doenças cardiovasculares são associadas a múltiplos fatores, como estresse, tabagismo, sedentarismo, portanto a manutenção da saúde requer o nosso olhar sobre todos estes pontos e não apenas sobre a dieta.
De qualquer forma, vale a recomendação de uma dieta equilibrada para manutenção de uma microbiota saudável e prevenção de doenças cardiovasculares.
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