Reflexões em tempos de pandemia: cientistas são cidadãos e a ciência pode ser cidadã

Por Kelmer Martins da Cunha & Elisandro Ricardo Drechsler dos Santos,  Depto. BOT-CCB/UFSC

Você já viu um cogumelo com deformação por causa de poluição? Na figura 1 são mostrados cogumelos “saudáveis” (imagem da esquerda) e cogumelos com uma deformação (imagem da direita) causada por gases poluentes da queima de diesel. Essa história é bem interessante e vem lá da Austrália. Um grupo de cidadãos voluntários, de uma associação que monitora espécies ameaçadas de extinção, acompanhou as anomalias na formação de cogumelos da espécie Hygrocybe reesiae. O caso foi parar no senado australiano, que considerou que a má qualidade do ar na área, além de colocar em risco a saúde humana daquela comunidade, também representava um risco para fungos ameaçados de extinção.

Figura 1: Cogumelos de Hygrocybe reesiae, saudáveis na esquerda e com deformação na direita. (fonte: Irga, et al., 2018).

Pois é, todo mundo sabe que os cientistas vêm alertando há décadas sobre as ameaças e extinções de espécies, mas poucos sabem que cidadãos voluntários podem se envolver em defesa da biodiversidade. Esse é um belo exemplo de ciência cidadã, onde cidadãos se engajam para ajudar a construir o conhecimento científico.

Temas como “crise da biodiversidade” e “extinção em massa do antropoceno” são assuntos atuais e carregam consigo uma realidade cruel e ainda ignorada pela maioria. Você sabia que, a cada hora, de duas a cinco espécies são extintas em florestas tropicais? Exatamente, são espécies Continuar lendo

Fósseis de fungos nos ajudam a contar a história da vida no planeta

Por Felipe Bittencourt & Elisandro Ricardo Drechsler dos Santos, Dpto. BOT-CCB, PPGFAP – UFSC

FIGURA 1: Gondwanagaricites magnificus (A) foto do fóssil de cogumelo mais antigo, depositado no Herbário URM da Universidade Federal de Pernambuco. (B) Desenho interpretativo do cogumelo fóssil, mostrando regiões anatômicas que comprovam a identidade fúngica (fonte: artigo original Heads et al. 2017).

O cogumelo fóssil mais antigo, batizado de Gondwanagaricites magnificus (Figura 1), foi encontrado recentemente no nordeste brasileiro, mais especificamente na Formação Crato da Chapada do Araripe (Ceará). Com aproximadamente 115 milhões de anos (ver artigo 2 abaixo), o fóssil é a prova que os cogumelos são tão antigos quanto o super continente Gondwana, que reunia os atuais continentes do hemisfério sul do planeta.

A formação de um fóssil requer uma série de eventos para que o organismo ou sua impressão sejam preservados. Por sua vez, os fósseis de fungos são raros, o que se deve ao fato de que poucas espécies produzem estruturas rígidas. Por este motivo, a paleomicologia, ciência que estuda os fósseis de fungos, ainda caminha a passos curtos.

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A bioluminescência dos fungos pode ser controlada… e utilizada

Por Elisandro Ricardo Drechsler-Santos – Depto. de Botânica e PPGFAP – UFSC

Ricargo DS imagem

“Se essa trilha
Se essa trilha fosse minha
Eu mandava
Eu mandava iluminar
Com micélio e cogumelos luminescentes
Para o meu
Para o meu amor passar”

Nesta paródia de uma das cantigas infantis mais populares menciono as espécies de fungos que emitem luz, que não fazem parte apenas das crendices populares. Esses fungos são reais, mas podem ser vistos na natureza somente à noite, em florestas totalmente escuras, longe das luzes das cidades, das lanternas, em noites sem a luz da lua ou dos raios que anunciam a chegada de uma tempestade. Por mais incrível que pareça, nessas condições de breu, é possível andar em uma trilha somente com a orientação das luzes esverdeadas emitidas pelas células dos fungos (micélio) que estão crescendo e decompondo as folhas no solo das florestas. Contando com um pouco mais de sorte, é possível ainda ver cogumelos inteiros brilhando na noite.

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Cogumelos venenosos podem salvar vidas

Por Elisandro Ricardo Drechsler-Santos & Cauê Oliveira
Depto. de Botânica e PPGFAP – UFSC

Figura 1: Amanita phalloides (Vaill. ex Fr.) Link, um dos cogumelos mais mortais do planeta, mas que produz moléculas que podem salvar vidas (fonte: https://goo.gl/images/r8kp8K).

As pessoas são micofóbicas? De modo geral os brasileiros são! O “medo” de fungos, ou micofobia (do latim, mico = fungo; do grego, fobia = medo), é um medo irracional de origem cultural. Observem: quando as pessoas ouvem a palavra “fungo” reagem fazendo cara feia de desaprovação ou de desconfiança, não é verdade? Bem, acredita-se que o “medo” ocorra em culturas que se preocupam principalmente com o aspecto perigoso dos fungos, principalmente em relação Continuar lendo