Células-tronco pluripotentes induzíveis – iPSCs podem realmente ajudar a tratar doenças?

Por Gabriela Pintar de Oliveira                                                                                                  CIPE – Centro Internacional de Pesquisas. Hospital AC Camargo – SP

Gabriela - figuraDesde que foi observada pela primeira vez, em 1665, por Robert Hooke, até os dias de hoje, a célula, a menor unidade formadora dos nossos tecidos e órgãos, ainda desperta o interesse dos cientistas. Mais de 200 tipos celulares formam os tecidos e o mais fascinante disso é saber que toda essa diversidade se origina de uma única célula (o zigoto unicelular, originário da união do óvulo e do espermatozoide). Durante a embriogênese, o zigotosofre transformações até formar uma estrutura chamada blastocisto, que apresenta um componente conhecido por massa celular interna. As células dessa região apresentam potencial para se diferenciar em todos os tipos celulares do corpo humano e a essa habilidade dá-se o nome de pluripotência. Essa é uma propriedade intrínseca importante das conhecidas células-tronco embrionárias e que tem sido largamente explorada nos últimos anos, tendo contribuído enormemente, por exemplo, para a construção de animais geneticamente modificados, que hoje são modelos importantes para o estudo de diversas doenças humanas. Esses animais são gerados para apresentarem sintomas ou mecanismos moleculares semelhantes aos que acontecem em humanos.

Apesar desses modelos representarem uma ferramenta valiosa na melhor compreensão dos mecanismos e da participação de diferentes tipos celulares nas doenças, um número muito expressivo de drogas com efeitos marcantes em animais não tem mostrado efeitos em pacientes. Isso ressalta a necessidade da busca por modelos de doença que utilizem células humanas, ou, ainda melhor, células daqueles pacientes que apresentam a doença. Entretanto, ao pensarmos, por exemplo, em uma doença neurodegenerativa como o Alzheimer, como seria possível obter neurônios diretamente do cérebro do próprio paciente? Ou ainda, como obter células a partir do coração de um paciente com algum tipo de doença cardíaca?

As células-tronco induzíveis surgiram como uma ferramenta poderosa nesse contexto. Essa tecnologia permite reprogramar células com identidade definida: diferenciar os fibroblastos da pele em outros tipos celulares, como neurônios e cardiomiócitos, por exemplo. No ano de 2008, o Dr. Yamanaka foi o primeiro a induzir a expressão de um grupo de fatores de transcrição (Oct3/4, Sox2, Klf4 e c-Myc; os fatores de Yamanaka) para atingir esse objetivo. Uma das grandes vantagens da utilização dessas células como modelo de estudo é que elas apresentam a complexa assinatura genética do paciente de origem. Além disso, elas representam uma fonte ilimitada para identificação de mecanismos de doenças e testes de possíveis terapias, e seu uso não apresenta todas as limitações éticas inerentes ao uso das células-tronco embrionárias. Apesar dessa tecnologia ter sido descrita em 2008, apenas nos anos mais recentes os cientistas têm conseguido obter sucesso em sugerir mecanismos e terapias a partir da utilização das mesmas. E esse é um campo da ciência que tende a se desenvolver cada vez mais.

A utilização das células-tronco induzíveis como modelo experimental tem se destacado, particularmente, no estudo de doenças cardiovasculares e também doenças do sistema nervoso central (SNC). Doenças neurodegenerativas, como, por exemplo, Alzheimer, Parkinson e a Esclerose Lateral Amiotrófica, podem ser hereditárias ou podem se apresentar na forma esporádica. Ao pensarmos nas formas hereditárias, em que há uma determinada mutação, fica um pouco mais fácil imaginarmos que mecanismos decorrentes da presença dessa determinada mutação podem ser responsáveis pela morte dos neurônios e consequente aparecimento dos sintomas. Contudo, se pensarmos que a maior parte dos casos dessas doenças correspondem às formas esporádicas, ou seja, quando não é possível estabelecer ao certo “um culpado” pelo surgimento da doença, a diversidade de mecanismos que podem levar à morte dos neurônios vai dificultar a identificação de uma terapia única que seja capaz de tratar todos os casos da mesma doença. Mas, e se fosse possível testar uma terapia primeiro in vitro com neurônios semelhantes aos neurônios do paciente? Essa é uma das grandes apostas que têm sido feitas ao se pensar nas células-tronco induzíveis. Os desafios a serem enfrentados ainda são enormes, mas os diversos grupos de cientistas ao redor do mundo têm concentrado esforços para que o uso dessa tecnologia possa, no futuro, contribuir no tratamento dessas doenças complexas.

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3 comentários sobre “Células-tronco pluripotentes induzíveis – iPSCs podem realmente ajudar a tratar doenças?

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