Por Elisandro Ricardo Drechsler-Santos Depto. de Botânica e PPGFAP – UFSC
Qual o segredo das árvores? Elas são nucleadoras, no sentido em que naturalmente cada árvore forma associações diretas ou indiretas com centenas, talvez até milhares de espécies em florestas preservadas ou degradadas. Em setembro de 2016 foi publicado, na prestigiada revista da Academia Americana de Ciências – PNAS, um estudo de avaliação da biodiversidade na Costa Rica, em uma área onde existem fragmentos preservados de floresta tropical e partes sem floresta, por causa da agricultura. Os cientistas observaram que na medida em que o número de árvores se tornava maior, o número de espécies demamíferos, aves e até mesmo plantas aumentava em uma proporção significativa. O trabalho mostra que o estabelecimento de uma única árvore na área de campo pode aumentar de zero até 80 espécies de aves, e na medida em que a cobertura da área reflorestada aumenta, o número de espécies continua subindo gradualmente, inclusive com o aparecimento de espécies de aves e felinos consideradas ameaçadas (clique aqui para acessar o artigo original).
Sobre as árvores serem nucleadoras, essa não é uma novidade para os micólogos, especialistas no estudo dos fungos. Já é de nosso conhecimento que uma única árvore pode ter associações com centenas de espécies de fungos ao mesmo tempo. Dentre estes estão os micorrízicos, endofíticos, patógenos, epifíticos etc.
Os micorrízicos se associam às raízes para uma relação de benefícios tanto para os fungos quanto para a planta (ver CDQ “Fungos estruturam a internet natural das florestas”). Dá para acreditar que uma única árvore pode ter mais de 100 espécies de fungos micorrízicos associadas as suas raízes? Pois é, exatamente isso que diz o artigo de revisão de Peay e colaboradores (2016), publicado a famosa revista Nature Reviews. Além disso, mencionam que é possível que todas as plantas do planeta possam ter micorrizas.
Ainda dentro das plantas existem os fungos endofíticos e os patógenos. Os endofíticos (do grego endo = dentro e phyton = planta) estão vivendo sem causar qualquer sintoma aparente e são tão diversos quanto as micorrizas, talvez até mais. Com novos métodos de sequenciamento de DNA já foi possível quantificar mais de 2000 espécies vivendo em uma única espécie de planta (clique aqui para acessar o artigo original).
No caso dos patógenos ou parasitas, que são prejudiciais podendo até causar a morte da planta, são dezenas de espécies específicas só de folhas, outras só de raízes e ainda outras só de troncos de uma única planta.
Para finalizar sobre os fungos, os epifíticos (do grego epi = sobre e phyton = planta) são aqueles que vivem sobre as plantas. Dentre eles, cito apenas os liquens, que são associações entre fungos e algas (ver CDQ “Há um terceiro elemento na simbiose dos Liquens”). Além de extremamente diversos, às vezes chega a ser impossível contar o número de liquens que podem ser observados sobre galhos, folhas e troncos de uma única árvore.
Voltando ao trabalho sobre árvores como nucleadoras de biodiversidade, merece destaque a proposta de uma ferramenta para quantificar a biodiversidade com objetivo de planejar reflorestamento e proteger espécies raras/ameaçadas em áreas não protegidas. Essas áreas sofrem constantemente com a ação do homem (agricultura, desmatamento, urbanismo, etc.) e as espécies da fauna (animais), flora (plantas) e micota (fungos), entre outros grupos de organismos, estão constantemente sob pressão, sofrendo com a perda de seus hábitats reprodutivos e alimentares. Estamos presenciando, no Antropoceno (período em que os humanos dominam o território e a biodiversidade do planeta), uma grande extinção em massa que ficará marcada na história da vida na Terra. Por outro lado, parece que os tomadores de decisões coletivas estão cada vez mais cientes da importância da biodiversidade para a manutenção dos serviços ecossistêmicos naturais. As plantas, como nucleadoras de biodiversidade, têm um papel central na limpeza e proteção das águas, polinização, controle de processos de desertificação, captura de carbono atmosférico com a manutenção de temperatura e das chuvas em áreas urbanas e agrícolas, entre outros benefícios que não precisamos pagar um único centavo.
Pingback: Cogumelos venenosos podem salvar vidas | Cientistas descobriram que... "CDQ"