Por Filipe Modolo – Dpto. de Patologia, UFSC

Felizmente a ciência tem sido incansável na busca da redução dos efeitos da pandemia da COVID-19. Alguns dos muitos estudos científicos que trataram de aspectos relacionados à pandemia da COVID-19 foram analisados por mim nesse blog científico: “O impacto da COVID-19 na saúde bucal”, “O impacto emocional da COVID-19”, “Os ensinamentos da pandemia” e “Glândulas salivares são alvos para o coronavírus”. No entanto, quanto mais a ciência se aprofunda no estudo dessa doença, mais complicada se mostra a rede de conexões biológicas existente na interação entre o coronavírus (SARS-CoV-2) e o seu hospedeiro humano.
Cientistas descobriram que pode haver uma relação muito íntima entre a COVID-19 e o câncer de boca. Já foi massivamente divulgado que a boca é uma porta de entrada importante para a infecção pelo SARS-CoV-2 e que a perda do paladar (chamada tecnicamente de disgeusia) é um dos primeiros sintomas da COVID-19. A disgeusia, quando reconhecida, pode ser o primeiro passo no processo de diagnóstico precoce dessa grave doença. Ambos os eventos (a infecção e a perda do paladar) são atribuídos, principalmente, à ligação entre o SARS-CoV-2 e o receptor ACE2 presente nas células epiteliais da boca, principalmente, na superfície da língua.
O receptor ACE2 é um componente importante do sistema RAS (sistema renina-angiotensina), um sistema biológico altamente associado ao desenvolvimento do câncer de boca. É sabido que o aumento da presença do receptor ACE2 nas células epiteliais malignas está associado com a progressão do câncer de boca e com a piora no prognóstico destes pacientes. Além disso, o fumo de tabaco, um dos maiores causadores do câncer de boca, leva a um aumento da quantidade de receptores ACE2 na boca, o que pode resultar numa maior taxa de infecção pelo SARS-CoV-2! Ou seja, o desenvolvimento do câncer de boca e a infecção pelo coronavírus compartilham uma via de sinalização importante e podem interagir de uma forma que ainda não compreendemos!
Os autores pontuam que essa relação deva ser mais bem investigada para entendermos melhor quais seriam suas possíveis implicações negativas para os pacientes portadores de ambas as doenças. Um bom exemplo dessa relação seria o caso dos pacientes fumantes, um grupo que pode ser considerado grupo de risco para a COVID-19. É notório que uma das principais causas de agravamento da COVID-19 é o comprometimento respiratório que muitos pacientes apresentam e o paciente fumante merece atenção especial, pois já apresenta diversos problemas no funcionamento do sistema respiratório causados pelo fumo. Quando constatamos que o fumo aumenta a quantidade de receptores ACE2 na boca e aumenta a probabilidade de infecção pelo SARS-CoV-2, entendemos o quão grave é a situação desses pacientes que, teoricamente, seriam mais infectados e teriam um curso de doença mais grave.]
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